América 4x1 Ipojuca — novela boa é jogo do Mequinha


Quarta-feira, 19h. O América entrou em campo contra o Ipojuca já com a pose de quem não perde há 1.095 dias. É tanto tempo sem derrota que tem jogador que começou a carreira nesse período, casou, separou e ainda não viu o Mequinha tropeçar. É bonito de ver. E é perigoso também, porque a gente se acostuma mal.

No Arruda, a FPF transmitia tudo de graça pela TV, em horário clássico de novela das sete. Só que a trama mais envolvente do dia não estava na Globo, mas no gramado do Mundão. Tinha drama, tinha herói, tinha vilão e tinha, claro, aquele alívio cômico chamado Renan. Nosso goleiro resolveu inovar: cada saída de bola era um stand-up improvisado. O torcedor já não sabia se gritava “Bora, América!” ou “Socoooooorro!”. Mas, como em toda boa comédia, no fim deu certo.

Enquanto parte do Recife se perguntava quem ia terminar com quem na ficção, a torcida do América largou o sofá, encarou o trânsito da cidade e foi assistir de perto mais um capítulo da maior série de invencibilidade do futebol pernambucano. Teve torcedor que se atrasou, claro. Quem conhece a cidade sabe: é teste de paciência, e ônibus cheio é arquibancada itinerante. Muita gente acompanhou os primeiros minutos colada no celular, dentro do coletivo, vibrando baixinho pra não assustar os passageiros que não entendem o que é ser América. Mas chegar ao Arruda compensa: o cheiro da grama, o batuque da Império Verde e aquele refrão que sacode até quem jura não gostar de futebol.

Primeiro tempo: Renan, nosso vilão preferido

A bola rolou às 19h em ponto, e o América começou do jeito que a torcida gosta: mordendo em cima, se impondo como líder. O problema é que Renan, nosso goleiro, decidiu dar emoção extra. Saídas de bola mal calculadas, um “quase presente” pro Ipojuca… parecia combinado pra testar o coração do torcedor.

O Ipojuca, coitado, até tentou. Túlio correndo feito novela mexicana atrás de final feliz. Mas quando a trama pedia um herói, ele apareceu: Renato Henrique, nosso artilheiro e aspirante a ídolo pop, aproveitou escanteio e surgiu na área como quem chega atrasado na festa mas rouba a cena. Gol aos 37 da primeira etapa. Um chute seco, um gol que valeu por quatro dias de calmante e a certeza de que, se tem bola parada, tem festa americana. E se Deus perdoa, Renato Henrique não.


Omah, Capela e o roteiro perfeito

O segundo tempo trouxe a reviravolta digna de folhetim. Na volta do intervalo, Franklin Omah, a jovem promessa nigeriana, escreveu o capítulo mais bonito da noite! E mostrou que a internacionalização do América não é conversa fiada. Recebeu na direita e soltou um balaço que ainda ecoa no bairro do Arruda. Gol lindo, bomba no ângulo. Golaço de quem já entendeu a mística de ser América. Daqueles que a gente repete na pelada do fim de semana e sempre manda por cima da trave.

Minutos depois, Henrique Capela, zagueiro do Ipojuca, resolveu dar uma força e mostrou solidariedade. Em vez de cortar, guardou contra o próprio patrimônio. É o famoso gol de amigo. Personagem secundário que, sem querer, muda o rumo da novela. América 3x0, e a torcida já cantava como se fosse o último capítulo.

Pra não dizer que não houve emoção, o árbitro arrumou um pênalti pro Ipojuca no fim. Zé Felipe bateu, diminuiu e deu aquela esperança de que o roteiro podia complicar. Pequena tensão no ar — porque torcedor raiz do Mequinha não sabe viver sem drama. Mas aí veio Esquerdinha, que entrou fresco em campo e decidiu acabar com a resenha: arrancada pela esquerda, dribles curtos e um chute no cantinho. Passou por quem quis e fechou a conta em 4x1.



A moral: tradição não é moda

O América não ganhou só três pontos. Ganhou confiança, respeito e mais alguns fios de cabelo branco na torcida por causa das saídas de Renan. O elenco é forte, talvez o melhor dos últimos tempos, e a invencibilidade já virou folclore. Quem passar pela Estrada do Arraial nesta quinta-feira verá a plaquinha da CIPA na sede do Mequinha mostrando que o Periquito está há 1.096 dias sem “acidentes com derrotas”. E pode parecer bobagem, mas é que, além do acesso necessário para as pretensões de renascimento do clube, existe um desejo no ego emeraldino: voltar à elite como o único clube campeão pernambucano nas três divisões.

Com a vitória, o América chegou a 10 pontos, manteve o melhor ataque da competição (12 gols) e mostrou por que é candidato natural ao retorno à Série A1. Renato Henrique segue como artilheiro isolado, e o elenco vai se firmando sólido em busca do acesso. Domingo, na quinta rodada, o time tem folga merecida e só volta a campo no dia 28 de setembro, como mandante. E quando voltar, mesmo sem ter jogado, ainda estará líder invicto do grupo! Se será no Grito da República, no Arruda ou sabe-se lá onde, descobriremos nos próximos capítulos deste folhetim.

Ser América é isso: trocar a novela das sete por uma trama muito mais emocionante. É sofrer no trânsito, ver parte do primeiro tempo dentro do ônibus, gritar gol no celular e depois chegar ao Arruda pra abraçar a turma. É rir dos sustos do Renan, se encantar com os gols do artilheiro e sair do estádio com a certeza de que tradição não é moda. É foda.







Um comentário:

  1. Baita roteiro, eu estive lá e pude acompanhar de perto e vibrar por cada lance, meu goleiro ele gosta de testar o coração saindo com os pés, mas fecha muito bem a barra. Sensacional o texto

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