Por CARLOS HENRIQUE, GM
Em um passado não muito distante havia sempre uma tendência do torcedor ter a simpatia por um outro time, o segundo time do coração. Os meus amigos diziam na época: eu torço por A e simpatizo por B. geralmente o segundo time do coração não era um arqui-rival, e sim uma quarta força, por exemplo. Aquele que pudesse tirar pontos dos grandes clubes adversários do primeiro time do coração.
Em outras situações o segundo time era de outro estado, geralmente do sul e sudeste, pois a rivalidade era grande, até mesmo no nordeste. Era comum se ouvir: sou do Sport aqui e do Flamengo no Rio (isso antes de 1987).
Pois bem, “um dia eu fui ameriquinha”! No final dos anos 60 e início de 70 eu torcia pelo Náutico (ainda hoje) e pelo América. Estava sempre presente no famoso “clássico da técnica e da disciplina”. Só não entendia na época porque aquele time alviverde, com 6 títulos estaduais, 9 vice-campeonatos, não tinha um estádio próprio, sua torcida era diminuta, as equipes montadas a cada campeonato eram cada vez mais fracas, e era derrotado na maioria dos clássicos.
Até meados dos anos 50 o América lutava de igual para igual com alvirrubros, tricolores e rubro-negros. O início da decadência do mequinha coincide com o início da ascensão do futebol do Náutico, de 1934 para cá. Os americanos da velha guarda afirmam que, um dos motivos do América ter encolhido ao longo dos anos foi exatamente a falta de um estádio próprio. Os torcedores mais jovens não têm idéia da importância do América nos anos 20 a 50.
Bom, mas o que interessa é que, “um dia eu fui ameriquinha”! No ano de 1975 pude presenciar a montagem de uma equipe forte, competitiva, com a contratação de jogadores de renome nacional. E o responsável por essa revolução no futebol americano foi o ex-dirigente do Sport, José Joaquim Pinto de Azevedo, hoje ocupando um cargo técnico na FPF.
Não sei os motivos que levaram o dirigente José Joaquim a sair do Sport e migrar para o América. Diziam na época que era uma questão pessoal entre ele e o presidente Jarbas Guimarães, do Sport, que montou uma verdadeira seleção naquele ano, em busca do título que eles não viam há 13 anos.
José Joaquim conseguiu montar o time do América com jogadores experientes, alguns famosos, talvez até com intuito de mostrar aos rubro-negros a sua capacidade como cartola do futebol. Com essa virada de casaca ele ganhou um apelido prá lá de engraçado: “o homem melancia”! Verde por fora e vermelho por dentro.
Para o gol do mequinha foi contratado o Renato 74, que fez sucesso no Bahia. Na defesa tinha Birunga e Cabral (ex- Santa Cruz, além de Cidão (ex-Sport). O cabeça de área e capitão do time era o experiente Otávio Souto, entre outros reforços.
Como não tinha estádio próprio o América treinava no campo do Colégio Americano Batista. Vez por outra eu estava lá assistindo aos treinos, principalmente o dos goleiros, onde Renato 74 e Carlos exercitavam exaustivamente os fundamentos da posição.
A imprensa local dava uma certa atenção ao time do América, tanto pelas polêmicas dos dirigentes, como pelos jogadores contratados, e também na tentativa de soerguer o clube, que já vinha numa descendente no futebol. O clube era carinhosamente chamado de VERDÃO 75. Nos seus jogos sempre havia a presença de uma torcida, mesmo pequena, mas com charanga e bandeiras alviverdes.
Foi então que no dia 27 de março aconteceu o tão esperado duelo entre AMÉRICA X SPORT. No duelo dos dirigentes o embate era entre JOSÉ JOAQUIM X JARBAS GUIMARÃES, e dentro de campo o encontro de dois grandes goleiros, TOBIAS X RENATO 74. Como a chamada do jogo era do América, o estádio do Arruda foi o escolhido, pois havia a perspectiva de casa cheia e boa renda.
Era a 3ª rodada do 1º turno do campeonato – PE, e naquela ocasião os líderes eram exatamente o Sport, Náutico, Santa Cruz e América. Tratava-se então de um duelo de líderes.
A minha expectativa era grande, uma vez que, pela primeira vez estava numa arquibancada torcendo pelo meu 2º time do coração (já que contra o Náutico...). A torcida do América ficou localizada na arquibancada da Rua das Moças. Era grande o número de americanos, animados pela charanga, colorindo o estádio com bandeiras alviverdes, e com direito até a foguetório na entrada do time em campo. Mais de 20 mil pessoas foram ao Arruda naquela quinta-feira à noite. Com certeza alguns outros alvirrubros e tricolores estavam ali também.
Mas a festa demorou pouco tempo. Exatos 3 minutos. Ninguém do América contava com o desastroso trabalho da arbitragem. O juiz Sebastião Rufino (aquele mesmo que, meses mais tarde prejudicaria o Náutico na final contra o Sport) e o bandeira Constâncio Filho validaram um gol de Garcia, logo no início do jogo, num impedimento ESCANDALOSO, onde só quem não viu foram eles e os torcedores que não foram ao estádio.
Os jogadores do América correram para o bandeira, com justas reclamações. O coronel Rufino foi logo amarelando Cabral e Cidão. A partida foi reiniciada e, 20 minutos depois o mesmo Garcia fez 2X0. Pronto, o periquito estava no papo. No começo do 2º tempo Peri fez 3X0 fechando o placar. Os pobres torcedores americanos começaram a romaria, abandonando o estádio. E eu fui junto com eles.
Fui para casa decepcionado com o contexto final. Fizeram uma onda muito grande sobre o jogo, a rivalidade dos bastidores entre os dirigentes, e pintaram o América como um verdadeiro time grande. Tudo poeira! Naquele momento, mesmo ainda adolescente, dava para sentir que o poder estava falando mais alto. Era nítida a falta de solidez do ameriquinha, como time e como clube.
O Diário de Pernambuco do dia seguinte trazia a seguinte manchete: “pelo futebol, pelos valores individuais, e pela disparidade técnica, o Sport não precisava da ajuda da arbitragem”!
Agora em abril o América completa 96 anos. Está fora da 1ª divisão desde 1995, ganhou o último título no longínquo 1944, vice em 1952, e só. Seu título mais importante e histórico foi o de campeão no ano do centenário da república (1922), chegou a ter torcedores ilustres como o poeta João Cabral de Melo Neto e Rubem Moreira (o Rubão). O América hoje em dia agoniza, e encontra-se à beira da extinção.
Não quero aqui ser profeta, mas é evidente o processo de asfixia que o clube dos 13 implantou no resto do futebol brasileiro. Vários clubes de tradição espalhados por esse Brasil afora clamam por oxigênio para sobreviverem. No máximo recebem uma pequena chance de respirar na Copa do Brasil, ou vez por outra uma participação como figurante na Série A. Em breve veremos muitos ”Américas” vagando pelos campos de futebol.
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Texto originalmente publicado no Blog do Roberto (http://oblogdoroberto.zip.net).
Apesar do texto realista, achei um tanto quanto pessimista. Acho que a esperança é a bandeira máxima do americano recifense.
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